Já é lugar comum antes de uma partida da Seleção Brasileira com Neymar. O treinador da equipe adversária recebe a pergunta: ‘como parar?’. As respostas são das mais variadas, e muitas delas são tão banais quanto sinceras quando se cai no lugar comum de dizer que é impossível parar, na bola, um craque de tamanha qualidade.
Talvez, a única pessoa que possa parar Neymar seja ele mesmo. Principalmente por causa do temperamento, do pavio curto que algumas vezes já lhe rendeu cartões e suspensões defendendo a camisa 'canarinho'. A raiva nem sempre veio com o excesso de faltas: às vezes o simples fato de encarar uma equipe com defesa impenetrável despertava a ira do craque brasileiro.
Arce deve ter avaliado esses dois pontos antes de montar a sua estratégia. O treinador da Seleção Paraguaia, que teve passagens marcantes por Palmeiras e Grêmio nos tempos de jogador, buscou armar direitinho a sua retaguarda para evitar os gols na Arena Corinthians. Mas é de se imaginar que também tenha orientado os seus comandados a parar Neymar de qualquer jeito - e se fosse para irritar o camisa 10 do Brasil, melhor ainda!
Quando a bola rolou em Itaquera, deu para perceber que o camisa 10 da Seleção seria o grande alvo. Em menos de dez minutos, foram três faltas sofridas. Mas não era só isso. Os paraguaios se fecharam bem, e concentraram boa parte de seus homens no lado direito da defesa. Isso porque Neymar joga pela esquerda do ataque brasileiro.
É nessas horas que você vê a diferença em uma equipe bem armada, porque se o jogo com Neymar estava mais difícil os brasileiros souberam rodar bem a bola e aproveitar a força do grupo. Quando o Brasil abriu o placar, aos 34’ do primeiro tempo, foi pelo lado direito de seu ataque. Philippe Coutinho partiu com a bola, tabelou com Paulinho e disparou um belo chute de fora da área (sua especialidade) para vencer o goleiro Antony Silva. Quando o primeiro tempo terminou, a equipe treinada por Tite havia concentrado a maior parte de seu jogo em um setor no qual Neymar não costuma aparecer tanto: 42,4% das investidas foram pelo flanco direito.
Mas aí veio o segundo tempo, e não deu mais para os paraguaios pararem Neymar. Seja pelo cansaço ou por terem que buscar o resultado, os comandados de Arce ficaram completamente perdidos em campo. Nos primeiros minutos, o camisa 10 brasileiro quase ampliou o placar após passe de Coutinho; depois, recuperou uma bola que estava com o adversário, partiu para dentro da área e sofreu o pênalti.
A cobrança, defendida por Antony Silva, foi um anticlímax, mas o capitão não se abalou e continuou sem se esconder. Neymar comandava o time, mas, no linguajar popular, ‘não era noite’. Pelo menos não até ali.
Neymar ainda fez um gol anulado pela arbitragem. Era de se imaginar que as críticas direcionadas a ele fossem ser duras se o roteiro seguisse aquela ordem. E caso fosse assim, já seria uma grande injustiça: ele não tinha perdido a cabeça, apesar das muitas faltas sofridas, buscava o jogo e criava lances de perigo a favor de seu time.
A justiça foi feita no minuto 64. Neymar estava no campo de defesa e, como se fosse um lateral esquerdo, pegou a bola por ali e saiu em disparada: passou por dois jogadores que tentaram fazer a falta e, num piscar de olhos, já estava na entrada da área. Tamanho era o medo dos adversários, que um deles até entrou no meio do chute e desviou a trajetória da bola antes dela encontrar as redes.
A comemoração foi emocionada e com raiva, do jeito que tem que ser. É compreensível: aquele era o seu sexto arremate a gol, em nenhum outro compromisso por essas Eliminatórias ele havia tentado tanto (no final da partida, ainda arriscou outros três).
Também deu tempo de participar da bela troca de passes que terminou no terceiro e último gol da noite, anotado por Marcelo. Uma exibição de gala e força. Se já havia quebrado o seu recorde de chutes a gol nestas Eliminatórias, Neymar também criou oportunidades como em nenhum outro encontro do certame (5, incluindo aí 2 escanteios), e apareceu com destaque na fase defensiva ao igualar as sete recuperações de bola que fez no clássico contra a Argentina.
Neymar também terminou a partida como jogador que mais tocou na bola (83 vezes), tentou (9) e acertou cruzamentos (4). Tudo isso, sem deixar que as faltas excessivas dos paraguaios o tirassem do sério. Se na entrevista coletiva na véspera do jogo Tite disse que o seu camisa 10 voltava a ser capitão – dentro do rodízio que existe – por ser uma liderança técnica, o comandante canarinho pode sorrir ao ver que craque também foi um capitão em espírito. Com o Brasil já classificado para a Copa do Mundo de 2018, é torcer para que o grande protagonista do time siga aliando estes dois tipos de liderança.