Depois de cinco Bolas de Ouro para Lionel Messi e outras cinco para Cristiano Ronaldo, o prêmio de melhor jogador do mundo finalmente deve ter um dono diferente.
Messi teve uma temporada excepcional no Barcelona, é verdade, com 34 gols e 12 assistências, sendo o artilheiro e líder de assistências de La Liga, além de ganhar o doblete na Espanha, a Chuteira de Ouro e também brilhar em alguns jogos na Champions League, como no confronto com o Chelsea. No entanto, o camisa 10 não dominou a Europa e viveu uma Copa do Mundo decepcionante com a Argentina.
CR7, por sua vez, não teve tanto destaque na Espanha, mas conquistou o tricampeonato da Champions League, sua quinta na carreira, sendo mais uma vez o artilheiro, com 15 gols. Ele brilhou em momentos decisivos, superou seus números na temporada passada, quando ganhou a Bola de Ouro, e teve um início espetacular na Copa do Mundo. No entanto, foi apagado contra o Uruguai, na eliminação nas oitavas de final, e viu adversáros na luta pelo posto de melhor do mundo brilharem mais em um contexto geral.
Com isso, a discussão que não existiu nos últimos anos, quando Messi e Cristiano Ronaldo dominaram o planeta e brigaram pela Bola de Ouro, passou a existir em 2018, com vários candidatos ao prêmio.
Alguns deles, cotados antes da Copa do Mundo, ficaram para trás. Mohamed Salah teve uma temporada absurda pelo Liverpool, brilhando intensamente e quebrando recordes na Premier League, e também se destacando na Champions. No entanto, a lesão na final europeia, acompanhada do vice-campeonato e de uma participação decepcionante do Egito no Mundial pesaram.
Kevin de Bruyne, espetacular com o encantador Manchester City que dominou a Inglaterra como nunca, teve seus momentos na Rússia, mas não foi o cara da Bélgica. Eden Hazard liderou os Red Devils com uma Copa do Mundo espetacular, mas passou longe de viver uma temporada dos sonhos com o Chelsea.
Neymar, por sua vez, saiu da Copa do Mundo menor do que entrou. Não fez um grande Mundial e, pelo PSG, apesar dos excelentes números na modesta Ligue 1, foi apagado no confronto com o Real Madrid pela Champions League, no grande jogo da temporada, além de ter sido atrapalhado por sua lesão no quinto metatarso do pé direito.
No entanto, se alguns craques ficaram para trás, outros três cresceram na Rússia, e merecem o prêmio mais do que CR7, que era o favorito antes do Mundial por conta de mais um título da Champions sendo artilheiro e decisivo nos grandes jogos.
O trio que luta pela Bola de Ouro é formado por Antoine Griezmann, Kylian Mbappé e Luka Modric. Os três merecem o posto de melhor jogador do mundo na última temporada. Um deles deve acabar com o reinado de Messi e CR7 e qualquer coisa contrária será um enorme absurdo. Os três, afinal, tiveram temporadas mais "completas" que os gênios e brilharam em momentos decisivos.
O garoto sensação
Mbappé, para muitos o maior desafio de Neymar para herdar o reinado argentino/português e para outros já maior que o brasileiro, não pode mais ser considerado um jogador para o futuro. O "Golden Boy" já é uma realidade.
O garoto já tinha brilhado no Monaco e, no PSG, foi absurdo em sua primeira temporada. Com 13 gols e oito assistências, foi fundamental na conquista da Ligue 1 e vital na recuperação da hegemonia doméstica, jogando demais na tríplice coroa francesa.
O brilho europeu não veio, com o PSG sendo uma presa até fácil para o Real Madrid, mas isso não importaria diante do que o jovem de 19 anos fez na Rússia. Com a camisa 10 francesa, ousada outrora por eternos craques como Michel Platini e Zinedine Zidane, Mbappé foi absurdo na Copa do Mundo.
Primeiro, marcou o gol da vitória por 1 a 0 contra o Peru, na fase de grupos, superando Trezeguet e se tornando o mais jovem a marcar pela França em Copas. O detalhe? Mbappé sequer era nascido quando o recorde foi estabelecido, em 1998.
Depois, ele triturou a Argentina, marcando dois gols, sendo o mais novo desde Pelé a balançar a rede duas vezes em um mata-mata de Copa do Mundo. Após manter o nível contra Uruguai e Bélgica, mas sem marcar, voltou a deixar sua marca na decisão contra a Croácia.
Mbappé se tornou o terceiro jogador sub-20 a ser campeão mundial. Apenas Bergomi e Pelé conseguiram isso, sendo que o Rei tinha apenas 17 anos em 1958 e, como o francês, também balançou as redes. O jovem craque do PSG ainda brilhou no Mundial com grandes jogadas, belos dribles e também criando lances de perigo e ajudando demais sua equipe na marcação.
Mbappé não foi "apenas" o melhor jovem, mas também um dos melhores jogadores da Copa do Mundo, foi absurdo na Rússia e mostrou uma maturidade incomum para a pouca idade que tem. Ele já está entre os melhores do mundo, na briga pela Bola de Ouro e é uma estrela. Vale lembrar, mesmo com apenas 19 anos. O garoto não completou sequer duas décadas de vida, mas já conquistou um Mundial e tem vários outros feitos. Ele ainda tem muito pela frente. Certamente ganhará o prêmio muitas vezes.
O maestro
Modric é outro que viveu uma temporada fantástica. Camisa 10 e maestro do Real Madrid, comandou a equipe no tricampeonato da Champions League, seu quarto título europeu na carreira. Como Marcelo, Kroos e outros destaques, o croata jogou demais, mas viu os holofotes, como sempre, ficarem em Cristiano Ronaldo. E com merecimento, diante do desempenho e dos feitos sensacionais do português, decisivo especialmente contra PSG e Juventus.
Importante pra variar em seu clube, vivendo uma excelente e vitoriosa temporada, Modric ainda fez uma Copa do Mundo excepcional. Merecidamente eleito o craque do Mundial, foi o camisa 10, capitão e maestro da vice-campeã Croácia.
O feito é gigantesco. Por mais que o time de Zlatko Dalic conte com vários excelentes jogadores como Rakitic, Mandzukic, Perisic e Rebic, por exemplo, é surpreendente a Croácia ter chegado até a decisão. E Modric foi o grande nome da campanha histórica.
No melhor desempenho da Croácia em Copas nos seus 23 anos de existência, Modric foi quem liderou o time, ditando o ritmo de jogo, criando as melhores chances de gol da equipe, balançando as redes, protagonizando belas jogadas, mostrando toda sua classe, técnica, habilidade e visão de jogo. E além de maestro, ele deu tudo de si, sendo o jogador que mais correu na Copa, mesmo com três prorrogações e duas disputas de pênaltis nas costas.
Faltou o título mundial para coroar a Copa exuberante do camisa 10. Ainda assim, Modric foi espetacular, jogando demais, sendo o craque da competição e liderando seu clube e sua seleção em feitos históricos. A temporada do craque foi absurda.
O cara
Kylian Mbappé e Luka Modric merecem a Bola de Ouro. Se eles ganharem o prêmio de melhor jogador do mundo será totalmente merecido. No entanto, quem mais merece a honraria e deve recebê-la é Antoine Griezmann.
O camisa 7, afinal, foi absolutamente fenomenal, super decisivo e teve uma temporada "completa". Além disso, dois anos depois das maiores decepções da carreira, o francês viveu uma emocionante redenção.
Em 2016, Griezmann jogou muita bola. Não à toa, foi reconhecido ganhando os prêmios de terceiro melhor jogador do mundo, jogador francês do ano, craque de La Liga e melhor jogador e artilheiro da Eurocopa. No entanto, se foi individualmente agraciado, faltaram as glórias coletivas.
Na final da Champions League, o craque perdeu um pênalti no tempo normal, e viveu uma dolorosa derrota para o rival Real Madrid, não conseguindo dar ao Atlético de Madrid seu sonhado primeiro título. Pouco mais de um mês depois, apesar de arrebentar na Euro, acabou derrotado por Portugal na decisão, perdendo outro título europeu, mas este em casa.
Griezmann sofreu com isso. Seguiu jogando muito e sendo reconhecido, mas sem ter conquistas coletivas. Mesmo sendo um dos melhores jogadores do mundo, o francês, aos 27 anos, só tinha conquistado a Segunda Divisão da Espanha, com a Real Sociedad, em 2010, e a Supercopa da Espanha, com o Atlético de Madrid, em 2014.
A redenção, porém, veio em 2018.
Quando garoto, Griezmann não teve as oportunidades que merecia na França, e precisou deixar sua casa, em Mâcon, e se aventurar na Espanha, onde ganhou uma chance da Real Sociedad, para realizar seu sonho de se tornar profissional.
Quis o destino que, treze anos depois de deixar sua casa, ele voltasse para finalmente conquistar seu primeiro grande título: a Liga Europa com o Atlético de Madrid. A decisão contra o Olympique Marseille, afinal, foi em Lyon, separada por apenas 45 minutos de distância de Mâcon.
E Griezmann foi o grande nome não só da final, mas do título colchonero. O camisa 7 marcou o gol de empate em Londres e deu a assistência para o tento de Diego Costa em Madri, na semifinal contra o Arsenal, sendo vital para o avanço colchonero. Já na decisão, finalizou três vezes, sendo duas no alvo, e balançou as redes duas vezes no triunfo por 3 a 0.
O francês foi o artilheiro do Atleti na Liga Europa, com seis gols, e o vice-líder de assistências, com dois passes para tentos, atrás de Ángel Correa e Koke, que deram três cada. Em oito jogos na competição, ele participou diretamente de oito gols. Griezmann foi simplesmente absurdo e protagonista.
Mas o seu ano de redenção não ia parar por aí.
Em um excelente time, cheio de excelentes jogadores e com nomes como Pogba e Mbappé, o craque era a grande esperança e referência técnica da França para fazer jus ao favoritismo e conquistar o bicampeonato mundial. E ele correspondeu na Rússia.
Atacante e matador no Atleti, o francês mais uruguaio que existe, apesar da camisa 7, jogou como um camisa 10 na Copa do Mundo. Atuando como armador atrás de Giroud, mostrou um Griezmann diferente e mais completo no Mundial.
Em uma França sem camisa 10, o 7 foi o maestro que comandou o ataque, criando boas chances e, ao contrário do habitual, concentrado em pensar, ditar o ritmo e criar oportunidades ao invés de definir os lances.
O time de Didier Deschamps não encantou nem foi brilhante, mas foi muito eficiente, tendo Griezmann como sua referência. E, pra variar, o craque foi decisivo e jogou demais, especialmente no mata-mata.
Contra a Argentina, abriu o placar e foi coadjuvante no show de Mbappé. Depois, contando com as ajudas de Varane e Muslera, fez a diferença com um gol e uma assistência contra o Uruguai. Nas semifinais, foi um dos melhores em campo contra a Bélgica, criando chances, finalizando e dando o passe para o tento de Umtiti, que garantiu os Bleus na final.
Já na decisão, foi brilhante e decisivo para a França como foi para o Atleti na partida decisiva da Liga Europa. A Croácia foi melhor e a arbitragem cometeu erros em lances decisivos, mas quem terminou com o título foi o time de Deschamps, e isso, além da eficiência, mais uma boa atuação defensiva e ótima exibição de Pogba, graças a mais uma tarde-noite inspirada de seu craque.
Griezmann cavou e cobrou a falta que rendeu no tento contra de Mandzukic, o primeiro gol francês. Depois, converteu a polêmica penalidade assinalada por Pitana com a ajuda do VAR. Como fez pelo Atleti na Liga Europa, ele deu um jeito de colocar seu time em vantagem em uma final, mesmo quando sua equipe era inferior ao adversário. E ele ainda participou da jogada do terceiro gol, marcado por Pogba, além de criar ótimas chances.
Se isso não basta, Griezmann, com mais uma ótima atuação, foi eleito o melhor em campo na decisão e superou lendas como Michel Platini e Zinedine Zidane com a camisa da França. O camisa 7 que jogou como 10 participou diretamente (com gols ou assistências) de 12 tentos em jogos mata-mata de Copas do Mundo e Eurocopas por seu país, mais que Platini (6), Zizou (8) e qualquer outro jogador na história da seleção.
Modric mereceu, mas Griezmann, que ficou com a Bola de Bronze, também merecia ganhar a Bola de Ouro da Copa do Mundo.
Como já mencionado, tanto Mbappé quanto Modric merecem ganhar o prêmio de melhor jogador do mundo, que estará em ótimas mãos com eles, no entanto, acredito que a honraria deve ser dada a Griezmann.
Mbappé jogou demais por seu clube, mas a Ligue 1 e as copas eram obrigações do PSG, que decepcionou na Champions League. Ele brilhou nos Bleus e foi fundamental na Rússia, mas não era o líder do time. Modric, por sua vez, foi fantástico e primordial na UCL, mas não o principal destaque do Real Madrid, e terminou a Copa sem o título, por mais que tenha sido fenomenal e liderado um feito extraordinário.
Enquanto isso, Griezmann, craque da França em uma Euro, foi agora também em um Mundial. O camisa 7 teve uma temporada mais "completa", sendo protagonista e decisivo em duas conquistas gigantes, ganhando a Liga Europa com seu clube e a Copa do Mundo com seu país. No seu ano de redenção, conseguindo as sonhadas glórias coletivas e os grandes títulos de sua carreira, ele merece ser coroado também com a Bola de Ouro.