Houve uma época em que Gerard Piqué não conseguia imaginar um time do Barcelona sem Carles Puyol. "Lembro do dia que voltei [de lesões em 2010-11] e no meio de um jogo eu disse: 'Puyi, senti muito a sua falta'. Ele me mandou calar a boca e me concentrar. Ele não parava nunca".
"Uma vez o jogo estava parado e alguém estava na maca, e ele começou a gritar comigo. Eu disse 'calma, está 4 a 0 e faltam três minutos'. Ele respondeu: 'E daí? Concentre-se. Eu te conheço'".
Como as coisas mudaram. Se no passado já foi Puyol que unia a defesa do Barça, agora é Piqué, o mesmo que uma vez admitiu que perdia a concentração durante as partidas na primeira metade da temporada.
Quando ele tirou um jogo de folga no último mês contra o Villareal -depois de jogar todos os minutos nos jogos da Liga até aquele ponto- o Barça se despedaçou, cedendo quatro gols em sua ausência.
Se não fosse por Luis Suaréz e Lionel Messi, eles teriam sido derrotas em El Madrigal. Ao invés disso, escaparam com um empate de 4 a 4 e não perderam o ritmo rumo a mais um título. É claro que os atacantes dominaram as manchetes por boa parte da temporada, mas Piqué tem tido um papel chave na luta do clube pela tríplice coroa. E isso depois de um começo péssimo de temporada.
Quando Piqué anunciou sua aposentadoria da seleção da Espanha depois da última Copa do Mundo, ele disse que precisava de mais descanso. E parecia mesmo estar sofrendo com a fatiga durante a primeira parte da temporada 2018-19.
Ele cometeu três erros que viraram gols ainda em outubro e a ausência de Samuel Umtiti fez muitos se preocuparem com a defesa do Barcelona para o restante da temporada. Mas Piqué, aos poucos, retornou à velha forma graças aos descansos conseguidos nas pausas para jogos de seleção. De volta à boa forma, construiu uma excelente dupla de zaga ao lado de Clement Lenglet.
A performance de Piqué foi crucial nos dois clássicos no Santiago Bernabéu em quatro dias no começo deste ano. Com controle, classe e compostura, Piqué foi enorme nas vitórias de 3 a 0 e 1 a 0 sobre o Real Madrid, acabando com os sonhos do rival na Copa do Rei e no Campeonato Espanhol.
"No campo Piqué desarma e afasta o perigo com calma, mas com a autoridade de um policial", escreveu Jorge Valdano em sua coluna para o El País. "Ele se movimenta com muita classe, quase de maneira provocativa. Tenho a impressão que Piqué está apaixonado por ele mesmo e, dado o que vimos nos Clássicos, ele tem todo o direito de estar".
É claro que o catalão ofereceu ainda outra obra-prima na semana passada contra o Liverpool pela semifinal da Champions League. O zagueiro Virgil Van Dijk entrou em campo laureado como o melhor defensor do mundo, mas Piqué foi o melhor da posição no jogo.
Enquanto o holandês foi considerado culpado pelos dois primeiros gols do Barça, Piqué foi elogiado pelo seu foco, antecipação e incrível posicionamento. "Ele sempre foi muito inteligente, mas agora é mais fácil perceber", disse Puyol.
"O mesmo com sua liderança, que sempre existiu mas que agora fica claro o seu completo controle no campo, especialmente na defesa. Seu posicionamento também melhorou, ele raramente se perde e sabe ler o jogo para se antecipar. Ele nunca perde a cabeça".
E é por isso que Puyol acredita que agora, aos 32, Piqué já o superou.
"Sim, ele é o melhor defensor do mundo", disse o ícone do Barça. "Somos diferentes, mas ele é chave para o Barça em tudo o que faz, além de ser um líder".
Agora o difícil é imaginar o Barcelona sem ele.