11 de junho de 2003. Leonardo Renan Simões de Lacerda, um jovem zagueiro de 15 anos, das categorias de base do Grêmio, acompanha atentamente a final entre Cruzeiro e Flamengo pela Copa do Brasil. Assistindo e vibrando com cada lance pela televisão, o garoto, nascido em Belo Horizonte e torcedor da 'Raposa' desde sempre, comemora a vitória por 3-1 e o título 'celeste', o quarto na história da competição. Certamente ele sonha em, um dia, conquistar um grande título pelo clube do coração.
27 de setembro de 2017. Léo, um defensor experiente, já está há sete anos no Cruzeiro, seu clube do coração, depois de passagens por Grêmio e Palmeiras. Bicampeão brasileiro e terceiro zagueiro com mais gols na história do clube, ele já realizou o sonho de conquistar um grande título pela Raposa, mas após perder a decisão da Copa do Brasil de 2014 para o maior rival, o Atlético-MG, tem novamente a chance de levantar o troféu que ainda não conseguiu.
Aquele menino que comemorou o título em 2003 não poderia imaginar que 14 anos depois estaria em campo enfrentando justamente o Flamengo em uma final de Copa do Brasil, tentando levar seu time ao quinto título do torneio. E como naquela vez, o jogo de ida terminou com empate de 1-1 no Maracanã.
Não à toa, a partida da noite desta quarta-feira (27), às 21:45 de Brasília (1:45 de Lisboa), no Mineirão, tem um significado especial para o zagueiro 'celeste', que deseja conquistar a Copa do Brasil para realizar um sonho e dar um passo para realizar outro. Em entrevista exclusiva à 'Goal Brasil', Léo falou sobre a emoção de disputar a final contra o Flamengo, as expectativas para o jogo e fez várias revelações. Confira o bate-papo:
Você é o terceiro zagueiro com mais gols (18 em 272 jogos) na história do clube, e está tentando superar o Cris (25 tentos em 260 partidas) e o Geraldão (30 bolas nas redes em 170 duelos) e se tornar o principal zagueiro-artilheiro da história do Cruzeiro. Além disso, é bicampeão brasileiro, conquistou outros títulos e recordes pelo Cruzeiro. Como é viver tudo isso pela equipe?
"Eu fico muito feliz. É bacana alcançar esta marca e vivo uma boa temporada. Fico feliz pelo momento e pela regularidade. Já são 51 jogos neste ano e 272 com a camisa do Cruzeiro. Fico feliz de estar podendo ajudar o Cruzeiro. Tenho a meta de poder se tornar o zagueiro que mais fez gols com a camisa do Cruzeiro e espero poder concretizar isso. É muito importante e fundamental na sequência da minha carreira."
Para um mineiro, torcedor do Cruzeiro, que cresceu sonhando em se tornar jogador de futebol e defender o time do coração, como é viver esse sonho? Você já tem sete anos de clube, é bicampeão brasileiro e agora está em mais uma final de Copa do Brasil.
"É uma honra e uma alegria enorme. Sempre passa na cabeça um filme do começo, do início. Eu cresci admirando o Cruzeiro, acompanhando, torcendo e vibrando, e hoje fazer parte disso dentro de campo, fazendo história no clube do coração é uma alegria enorme. Já são sete anos no clube, sou bicampeão brasileiro e estou alcançando minhas marcas. Cada vez mais quero quebrar recordes e fazer história no clube. É uma alegria muito grande, um sonho realizado e que vou realizando a cada dia e a cada partida."
Ainda tem algum sonho para realizar jogando pelo Cruzeiro?
"Quero ser campeão da Libertadores. Meu grande sonho é esse: ganhar a Libertadores pelo Cruzeiro e depois buscar o Mundial."
Qual o momento mais especial nestes sete anos no clube?
"O bicampeonato brasileiro. É enorme, um título nacional e ser bicampeão brasileiro não é fácil. Foi o momento mais importante da minha carreira."
Você agora tem a chance de ganhar a Copa do Brasil, título que ainda não tem pelo Cruzeiro. Você teve uma oportunidade, em 2014, mas a Raposa perdeu a decisão pelo maior rival, o Atlético-MG. Como você encara essa decisão agora? É uma chance de apagar a dor da derrota no clássico três anos atrás?
"É a segunda chance de ganhar a final. Perdemos a primeira, mas foi um ano maravilhoso. Estávamos próximos de conquistar novamente a tríplice coroa, mas disputar o título de duas competições como disputamos cria um desgaste muito grande. Foi um ano muito desgastante, mas ficamos felizes pelo título brasileiro."
"É claro que seria marcante conquistar a tríplice coroa, mas agora temos a chance de estar na final de novo. Sabemos que será um jogo muito difícil contra o Flamengo e precisamos do torcedor e de estar bem para ganhar esse título que é o sonho e o desejo de todos no Cruzeiro."
Vamos voltar ao tempo agora. Em 2003, o Cruzeiro conquistou a Copa do Brasil vencendo o Flamengo na final. O que fazia o Léo naquela decisão?
"Cara, eu já estava jogando na base do Grêmio e assisti aquele jogo na maior expectativa. Eu fiquei muito feliz e emocionado com o título. Eu torci muito pelo Cruzeiro."
Em algum momento você chegou a imaginar que um dia enfrentaria o Flamengo em uma final de Copa do Brasil como aquela que você assistiu em 2003?
"É difícil você imaginar algo assim, mas é engraçado como as coisas acontecem e é a vida. Como em 2003, estamos em uma final contra o Flamengo, e é uma coincidência boa. É claro que o jogo será muito difícil e totalmente diferente de 2003, mas espero que o resultado possa ser o mesmo com vitória para nós."
Você falou que o Cruzeiro precisará da força do torcedor para sair campeão do Mineirão. Você tem alguma lembrança especial dos seus tempos de torcedor do clube, de ir ver jogos e torcer na arquibancada?
"Cara, eu fui em um Cruzeiro e Atlético com vitória de 2-1 que foi muito marcante para mim. Eu fui em um Cruzeiro x Villa Nova do Campeonato Mineiro de 2000 também e outras partidas que me marcaram, mas acho que esse foi o que mais me marcou. Eu fui em muitos jogos como torcedor na arquibancada do clube, por isso hoje é muito legal estar dentro de campo pelo Cruzeiro."
"É claro que são coisas bem diferentes, porque os anos se passaram e o profissionalismo vem na frente e a gente acaba sendo mais profissional e diferencia a paixão da razão, porque a gente precisa ter a cabeça voltada para dentro de campo para fazer o melhor e antecipar as jogadas para conseguir vencer."
Você tem jogado praticamente todos os jogos do ano e é o zagueiro mais regular do Cruzeiro em 2017, mas seus companheiros mudaram ao longo da temporada até o Murilo se firmar nos últimos meses. Fale um pouco do garoto que é jovem, está começando sua carreira, ganhando espaço e renovou o contrato até 2021 na última semana.
"Eu joguei com vários zagueiros nestes sete anos de Cruzeiro: Bruno Rodrigo, Dedé, Manoel, entre outros. Agora, jogo com o Murilo, que é um menino bacana, que vem fazendo bons jogos, é seguro, firme e a gente tem conversado muito. Estamos nos entendendo bem e ele é tranquilo, está aberto a conversas, dicas e escuta muito. Ele está evoluindo e vamos crescer ainda mais como dupla para ajudar o Cruzeiro."
O Cruzeiro vive um ano curioso. Começou voando, parecendo que brigaria por todos os títulos da temporada. Depois teve uma queda: perdeu a final do Campeonato Mineiro para o rival Atlético-MG, foi eliminado de forma precoce na Sul-americana e viveu um momento de pressão no Brasileiro.
A torcida chegou até a protestar no CT, muita gente pediu a saída do Mano Menezes, mas a diretoria manteve ele e o Cruzeiro foi se recuperando. Agora, está no G6 do Brasileirão e na final da Copa do Brasil. Como você avalia esse ano de reviravoltas?
"Nós realmente começamos muito bem, mas vivemos o período difícil que você mencionou e, apesar de conseguirmos alguns bons resultados, não conseguíamos uma sequência de vitórias e regularidade, mas acreditamos no trabalho e conseguimos no recuperar para ficar bem no Campeonato Brasileiro e chegar na final da Copa do Brasil."
"O futebol tem dessas coisas. Todos os clubes passam por momentos difíceis e de turbulência ao longo da temporada, e às vezes isso é bom, porque nesses momentos o grupo se fortalece e amadurece para engatar uma boa sequência. É necessário passar por isso para se fortalecer."
Vários clubes mudaram de técnico nesta temporada e, como muitas vezes acontece, a troca no comando não melhorou as coisas. O Cruzeiro, mesmo com toda a pressão em cima do Mano Menezes e os resultados ruins, manteve o treinador e isso deu resultado, com a equipe superando a fase ruim e não só estando bem no Brasileirão como também na final da Copa do Brasil.
Você vê isso como um exemplo do Cruzeiro para o futebol brasileiro? A prova de que a mentalidade e cultura do nosso futebol está errada, a culpa não é sempre do técnico e o demitindo as coisas não vão necessariamente melhorar?
"Cara, eu acho que sim. Nem sempre a solução é mudar o comando. O futebol brasileiro precisa desse planejamento, dessa confiança, dessa segurança, de um trabalho e de uma filosofia. O Mano vem implementando isso durante o ano. Quando muda muito o treinador, o time perde isso, porque os jogadores já conhecem a maneira de trabalhar do treinador, e quando se troca muito o técnico, os jogadores acabam se perdendo, porque são filosofias e métodos de trabalho diferentes."
"Acredito que o planejamento traçado deve ser cumprido e, desta forma, coisas boas vão acontecer, porque o trabalho e a dedicação dão resultados. Aqui no Cruzeiro, o trabalho tem sido muito bom e, claro que um jogo ou outro não fará diferença se você sabe o caminho que está seguindo."
No momento de turbulência, o que foi importante para o Cruzeiro se reerguer e conseguir viver o bom momento atual?
"Acreditar no trabalho que vem sendo feito. O trabalho é bom, importante e de muita dedicação. Foi importante todo mundo acreditar no grupo, porque às vezes é um detalhe ou outro que faz as coisas não darem certo. Às vezes a bola bate na trave e sai e as coisas não dão certo. Por isso é preciso acreditar no trabalho que vem sendo feito. Esse tem sido o nosso lema e por isso a gente acredita que pode avançar e conquistar os nossos objetivos."
Existe alguma conversa, alguma partida ou algum outro fato que simboliza isso e essa retomada na temporada?
"Não tem uma partida específica, mas várias. Uma delas foi uma derrota para o Bahia, na qual jogamos com um jogador a menos, mas tivemos uma superação incrível e uma condição de jogo muito boa. Também a partida contra o Corinthians, em Itaquera, na qual jogamos muito bem, mostramos bom ritmo e tivemos boa atuação na casa do adversário. Foram jogos em que vimos que o trabalho vinha sendo bem feito e o que estava dando errado eram detalhes. A gente trabalhou forte e acreditou no trabalho, e aí as coisas começaram a dar certo e conseguimos uma boa sequência."
Falando em confiança, o Cruzeiro vem em uma boa sequência, de quatro jogos de invencibilidade, sendo três vitórias seguidas. Como isso afeta o time positivamente para a final?
"É muito importante. As vitórias são o que buscamos e nos dão confiança para seguir lutando pelos nossos objetivos. Sabemos do tamanho da decisão na quarta-feira e vamos mentalizar isso para vencer mais uma vez."
Como se preparar para enfrentar o Flamengo que também vem com mais confiança para a final, vem de bons resultados e tem o retorno do Guerrero no ataque?
"Sabemos das dificuldades que vamos enfrentar. Será um jogo difícil. Vamos precisar de todo mundo, da torcida, do ambiente do Mineirão vibrando a cada lance e a cada jogada. Sabemos que o Flamengo é um time experiente e com jogadores de qualidade, mas com o Mineirão ao nosso favor, espero termos uma boa noite de trabalho, fazer uma boa partida e buscar o resultado que precisamos."
Existe uma situação interessante no gol. O Fábio é um dos melhores goleiros do futebol brasileiro na última década, merecia inclusive chances na Seleção e vive excelente fase, protagonizando milagres em todas as partidas. Do outro lado, porém, o Muralha chega para a final pressionado e cercado de polêmica. Como você vê isso?
"O Fábio se dedica muito e está vivendo uma fase muito boa, mas o Muralha também é um grande profissional, se dedica muito e se empenha ao máximo. Dentro de campo, a responsabilidade é de cada um e, com certeza são situações que acontecem no futebol e o Muralha está se recuperando e fez jogos bons. São dois goleiros muito bons e vão apresentar um bom futebol, mas espero que o Fábio se saia melhor (risos)."
Como você vê aquela polêmica envolvendo o jornal carioca e o Muralha? E muita gente fala da possibilidade de um grande filme e uma grande história caso o Flamengo seja campeão tendo o Muralha como herói, diante de tudo que aconteceu com ele nos últimos meses. O que fazer para evitar que esse filme se torne realidade?
"Eu vi aquilo como uma falta de respeito. Sou muito a favor do Muralha. Ele é uma grande pessoa e um grande profissional, que se dedica, trabalha e empenha. Ele busca fazer o seu melhor. É preciso ter respeito. Mas, é claro, queremos evitar esse filme e essa grande história dele (risos)."
Você tem algum ritual antes dos jogos?
"Eu sempre procuro me concentrar e mentalizar a partida. Eu gosto muito também de ler muito e escutar músicas antes dos jogos. Eu procuro imaginar um pouco o jogo e certos lances e certas jogadas. Converso muito também com os companheiros e penso nas estratégias. Eu tento me concentrar mas também relaxar antes do jogo."
Tem alguma música e algum livro especial?
"Gosto de ler a Bíblia e alguns livros. Agora estou lendo um livro de um amigo, o Gustavo Caetano, o nome é 'Pense Simples'. Eu gosto de ouvir o CD da Camila Campos, que é bem pra cima. Eu gosto de ouvir música gospel e também um pop rock bem animado."