A lista de convocados nem havia sido divulgada e Tite pontificou um novo lema para a seleção: “Alegria e responsabilidade”. Como explicara Edu Gaspar, coordenador técnico da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), momentos antes, é assim que o Brasil vai encarar o desafio de jogar a Copa América em casa. Mas o que isso tem a ver com Neymar, já um veterano em termos de competições diante da própria torcida?
Neymar é, há nove anos, a única estrela de uma seleção que acumulou dissabores. Mal jogou o mata-mata da Champions League nos dois últimos anos por lesão e chega à Copa América envolto em (mais) uma polêmica, a do soco em um torcedor rival. É chover no molhado dizer que o papel do camisa 10 é fundamental para as pretensões do Brasil, e é justamente por isso que ele foi o grande assunto da entrevista coletiva.
Tite se recusou a falar sobre o episódio de Neymar com um torcedor do Rennes, na final da Copa da Liga da França que o PSG perdeu. Disse que se reservava ao direito de tratar sobre o assunto primeiro com o jogador porque “gostava que fizessem isso com ele”. Questão de postura, segundo ele.
Com isso, se recusou a responder o que achava da atitude, se Neymar vai ou não ser capitão do time ou mesmo se o craque vai ao menos levar um puxão de orelhas. Se limitou a dizer que “ele errou” e perdeu um pouco a compostura ao ser questionado se não estaria sendo incoerente por conta do caso de Douglas Costa, que ficou fora de uma convocação quando cuspiu em um rival atuando pela Juventus.
“Tu tiveste o cuidado de ouvir minhas respostas quando [Leandro, comentarista do Fox Sports] Quesada conversou comigo e quando o Igor Siqueira [repórter do jornal O Globo] me fez a pergunta? Coerentemente eu a tenho. E quando foi colocado a relação do Douglas Costa, eu falei que não é assunto que se fale por telefone. [...] Por que não foi convocado? Pelos dois fatores, pele lesão e o problema que aconteceu”, disse Tite.
Sob a proteção da “coerência”, manteve o camisa 10 sem ser atacado no ambiente da seleção. A lembrança de Edu Gaspar dizendo que “era difícil ser Neymar”, logo após a eliminação na Rússia, se soma a inúmeros outros episódios em que o melhor jogador de sua geração foi, de alguma maneira, “protegido”.
Neymar não foi, nos últimos nove anos, apenas o jogador mais importante da seleção brasileira. Ele também ditou o ritmo do time nos bastidores, teve ampla influência no comportamento de seus companheiros ao longo dos anos e moldou o ambiente da seleção do jeito que quis. Não raras vezes, a “ousadia e alegria” com a qual ele toca a vida se replicaram no dia a dia do Brasil em grandes competições.
Vai mudar alguma coisa na Copa América? Pelo menos no lema, sim. Sai a “ousadia” e entra a “responsabilidade”, tentando incutir na cabeça dos jogadores que há um peso inegável em jogar um torneio de grande porte no Brasil, mas que isso não pode ser mais importante do que o “orgulho” de defender a seleção.
Neymar vai perder a faixa? Vai levar uma bronca pelo comportamento na França? O criticado “cai-cai”, tão criticado na Copa, vai ser revisto? Em algum momento a comissão técnica vai tomar alguma posição pública mais dura com seu jogador mais importante? Algum dos outros nomes fortes do time vai emergir como líder? Nenhuma dessas perguntas tem resposta, ao menos conhecida abertamente. O que se sabe é que o lema mudou.