Ceni e a crise exacerbada em um caótico Cruzeiro
A derrota por 4 a 1 para o Grêmio terminou com frases fortes de jogadores e treinador, deixando evidente que o cenário não é nada bom.
A derrota por 4 a 1 para o Grêmio terminou com frases fortes de jogadores e treinador, deixando evidente que o cenário não é nada bom.
Mano Menezes escreveu uma belíssima história em sua passagem como treinador do Cruzeiro, algo marcado especialmente pelo bicampeonato da Copa do Brasil em 2017 e 2018. Entretanto, a sua saída do clube, em agosto de 2019, deixou evidente que o estilo de jogo mais pragmático não vinha mais dando resultados como antes.
Em seus últimos momentos no comando, a Raposa acumulou eliminações, o seu maior jejum de gols em todos os tempos e figurava na parte de baixo do Brasileirão. Rogério Ceni foi anunciado como novo técnico e chegou com a promessa de mudanças, mas se tem algo que não mudou é o clima de crise na Toca da Raposa.
Sob o comando de Ceni, as primeiríssimas impressões foram boas, mas não tardou quatro jogos para que problemas de relacionamento com alguns jogadores, algo que também já vinha acontecendo nos últimos momentos de Mano dentro do clube, aparecessem acompanhados de derrotas marcantes. Apenas a ponta do iceberg em um Cruzeiro que enfrenta dificuldades financeiras e passa pela maior crise institucional em sua história de 98 anos.
Esta crise ficou escancarada no final de maio, quando matéria feita pelo Fantástico, da TV Globo, mostrou grandes dívidas acumuladas pela atual gestão, encabeçada pelo presidente Wagner de Pires Sá, e transações irregulares de jogadores. O vice-presidente Itair Machado chegou a ser, por obrigação legal, afastado do cargo até conseguir voltar à cadeira recentemente. A relação com os torcedores, contudo, não é das melhores e o dirigente foi xingado após a goleada por 4 a 1 sofrida dentro de casa para o Grêmio, domingo (08), pela 18ª rodada do Brasileirão.
A derrota sofrida para os gremistas, aliás, abriu de vez várias feridas deste Cruzeiro de 2019. Uma delas, a irritação com os atrasos salariais – apesar de Thiago Neves ter minimizado, em julho, a questão. Perguntado sobre o assunto após a goleada sofrida, o goleiro Fábio, um dos maiores ídolos do clube, disse de maneira seca: “isso aí você tem que perguntar para a diretoria”.
E a diretoria reconheceu o problema: “Tem uma parte de julho que está atrasada e agosto venceu na última sexta-feira. Estamos trabalhando para regularizar isso o mais rápido possível”, disse o diretor de futebol Marcelo Djian. O mês de setembro segue o seu curso. O pior é que, segundo noticiado em matéria do UOL, a Raposa não tem atualmente os recursos necessários para quitar sua dívida com o elenco. Apenas em dezembro os mineiros irão receber a premiação estipulada no Campeonato Brasileiro, além da última parcela da venda de Arrascaeta para o Flamengo.
Evidente que em meio a tantas notícias ruins, os resultados em campo também ajudam a piorar o clima. Rogério Ceni estreou com vitória por 2 a 0 sobre o Santos, então líder do Brasileirão, com seu time tendo maior domínio da bola e criando mais oportunidades do que antes. O empate por 1 a 1 com o CSA, fora de casa, não chegou a revoltar, mas o time já apresentou queda de rendimento no triunfo por vantagem mínima sobre o Vasco da Gama.
E aí veio a derrota por 3 a 0 para o Internacional, que sacramentou a eliminação na Copa do Brasil. Foi quando Thiago Neves surpreendeu ao fazer críticas públicas ao trabalho de Rogério Ceni, dizendo que o treinador fez “muita mudança para a decisão”, sendo que a grande alteração do comandante foi a improvisação de Jadson no lugar de Edílson na lateral-direita. Após a derrota para o Grêmio, pelo Brasileirão, Rogério respondeu de forma clara o camisa 10: “Às vezes, o que aconteceu, acredito muito na declaração do Thiago, foi que ele viu um amigo no banco de reservas, no caso foi o Edilson, tá entendendo? (...) Então, não houve improvisação nenhuma. Aliás, houve o Jadson na lateral direita, de resto se você pega o time que jogou contra o Internacional é o mesmo que jogou contra o Vasco, contra o CSA, todos conhecedores da sua posição”.
Na mesma entrevista coletiva, Ceni deu um recado claro para os jogadores que poderiam não estar satisfeitos com sua forma de trabalhar: “A única coisa que eu digo é que, se for para continuar no Cruzeiro, tem que ser de maneira diferente. Se a gente precisar mudar drasticamente a situação, mesmo que a gente apanhe nos próximos jogos, mas a atitude temos que mudar, caso contrário, não faz sentido nem eu ficar aqui, muito menos comparecer após jogo para dar entrevista”, afirmou.
Ainda que não tenha falado diretamente, é provável que o treinador barre inicialmente alguns dos medalhões do time. Thiago Neves, Edilson, Fred e Robinho seriam alguns dos nomes que poderiam perder espaço: “Não é tirar, afastar. Temos que fazer comportamentalmente, talvez fazer para alguns atletas uma intertemporada, parar por uma semana, sem jogo. Modificar a maneira de jogar, por mais que eu goste de um futebol ofensivo e tente privilegiar jogadores de alta qualidade técnica”.
Desde que chegou à Toca da Raposa, Ceni trouxe o atacante Ezequiel, de 21 anos, e nomes que não vinham recebendo tanto espaço – casos de Maurício, Fabrício Bruno e Cacá – estão sendo escalados. Pedro Rocha, que já vinha ganhando mais chances desde o final de passagem de Mano Menezes, é outro que vai ganhando mais oportunidades. Mas enquanto o caminho é aberto para uns, pode ser fechado para outros.
E se Thiago Neves antes havia criticado as decisões do treinador, no último domingo (09), deu um puxão de orelha justamente nas caras novas do time: “Vários jogadores novos, que nunca passaram por isso. E aqui no Cruzeiro é assim, é time grande, que costuma brigar lá e cima e ser campeão. Então, para quem está chegando, é assim que tem que ser. Não adianta apontar para o Thiago, para o Henrique, para o Leo, os mais velhos. Acho que quem chegar, também tem que assumir a responsabilidade”.
Crise institucional, salários atrasados, resultados ruins, péssima colocação (16º, a uma de entrar na zona de rebaixamento) e relação conflituosa de parte dos jogadores com um treinador que chega para conseguir resultados com um modelo de jogo diferente ao que vinha sendo aplicado até então. É fácil explicar os motivos para o péssimo momento do Cruzeiro.