Quando Domènec Torrent aceitou o desafio de dirigir o Flamengo, sabia das dificuldades, principalmente por ter que substituir um treinador que, além de multicampeão, tinha a idolatria da torcida. O início, no entanto, foi mais difícil do que o catalão esperava. Elenco longe da boa forma física, calendário mais apertado que de costume, política interna, entre outros obstáculos que foram surgindo pelo caminho.
Hoje, quase três meses da chegada ao Rio de Janeiro, Dome está cada vez mais forte internamente, tem a confiança dos jogadores e o respeito das áreas que fazem o dia a dia do futebol funcionar.
"DISPUTA" COM RAMÍREZ E INÍCIO CONTURBADO
Apesar do Flamengo ter feito um "tour" na Europa e conversado com alguns treinadores, o grande adversário de Dome era Miguel Angel Ramírez. O comandante do Del Valle era o nome preferido de uma ala da diretoria, que fazia força para que se investisse na chegada do espanhol. Mas Dome ganhou a simpatia de Marcos Braz, vice-presidente de futebol. Braz tinha crédito pelo bom trabalho feito com Jorge Jesus e recebeu o aval de Rodolfo Landim para fechar com o catalão.
Recheado de muita expectativa e sob a batuta de ter trabalho durante 10 anos com Pep Guardiola, Dome chegou trabalhando e teve pouco menos de uma semana para conhecer o Flamengo e se preparar para a estreia no Campeonato Brasileiro. Ao desembarcar no Ninho do Urubu, ele conheceu a realidade que o esperava, apesar de um time multicampeão, havia muito trabalho pela frente.
A forma física dos atletas, depois de um período de descanso e sem treinador não era das melhores. O tempo de preparação foi curto e o desafio de fazer uma pré-temporada com bola rolando foi difícil. Duas derrotas no início do Brasileirão e gente pedindo a cabeça do treinador por todo lado, inclusive dentro da diretoria.
CONQUISTANDO O RESPEITO NO DIA A DIA
Ao encontrar algo diferente do que esperava, Dome começou a mudar, a tentar moldar um time de acordo com aquilo que acreditava. Isso, no começo, causou receio nos atletas que, além de longe da boa forma física, não estavam conseguindo assimiliar as ideias. O catalão, então, colocou em prática aquilo que acredita ser um dos príncipios básicos de um líder: ouvir. Dome pediu uma reunião com o elenco e escutou a todos.
O catalão não gosta de impor no grito, ele procura ouvir e tentar convencer os atletas de suas ideias conversando e mostrando conhecimento sobre determinado assunto. Foi assim que conquistou, por exemplo, Filipe Luís, um dos líderes do grupo. Outra característica importante de Dome que agradou aos atletas foi a valorização do grupo.
October 22, 2020
O treinador deu espaço a todos, conversou diretamente com cada jogador e os convenceu de que precisaria do grupo mais que qualquer jogador individualmente, foi assim que recuperou Lincoln, que voltou a ter projeção.
COVID-19 DEU FRUTOS
A derrota por 5 a 0 para o Del Valle poderia ter colocado fim ao trabalho de Domènec no Flamengo. Houve força política interna pela demissão do treinador, mas Marcos Braz se tornou o escudo e conseguiu segurar o catalão. Depois disso, o surto de Covid-19, que tomou conta do elenco e comissão técnica, foi chave para aliviar a pressão e unir o grupo.
Com inúmeras dificuldades, o Flamengo derrotou o Barcelona de Guayaquill no jogo seguinte, ganhou vários "reforços" caseiros após a participação dos garotos do sub-20 contra o Palmeiras no Campeonato Brasileiro e, em seguida, uma vitória que carimbou a volta por cima de Dome, os 4 a 0 contra o mesmo Del Valle, no Maracanã.
MUITO TRABALHO
Um dos pontos importantes para a diretoria em relação a Domènec foi acompanhar de perto o quanto o catalão é "viciado" em trabalho. Sem se abalar, ganhando ou perdendo, Dome se dedicou integralmente ao Flamengo. Analisando adversários, buscando maneiras de fazer o elenco assimiliar e acreditar em suas ideias. Até mesmo morar no Centro de Treinamento, de forma temporária, Domènec morou. Assim, conseguia otimizar o tempo e focar no trabalho.
VALORIZANDO A BASE
Se Dome conseguiu passar bem pela crise do Covid, os jovens atletas do Flamengo têm papel importante nisso. O treinador, desde quando chegou no clube, planejava trabalhar com a base, mas isso foi intensificado por conta do surto. Depois que os garotos deram conta do recado, ganharam moral com o treinador e espaço. Ele não teve problema em manter, por exemplo, Hugo Souza no gol, mesmo com César sendo, até então, o substituto direto de Diego Alves.
Com essa mesma filosofia o zagueiro Natan não volta mais para a base. Ele ganhou não só mais espaço no elenco, como a possibilidade de brigar de igual para igual pela titularidade.
October 18, 2020
O treinador reforça internamente que a base vai jogar, que gosta de trabalhar com garotos e que planeja desenvolver muitos deles, não só nesta temporada, mas principalmente na próxima. Afinal, como ele mesmo diz, veio para um projeto de anos e não apenas 12 meses.
DECISÕES PELA FRENTE
Com cada vez mais moral internamente, Dome se prepara para encarar uma sequência pesada nas próximas semanas. Jogos contra times da parte de cima na tabela do Brasileirão, oitavas da Copa do Brasil e da Copa Libertadores da América.
Neste domingo, o Flamengo encara o Internacional, atual líder do Campeonato Brasileiro e em seguida, na quarta, o Athletico-PR, pela Copa do Brasil. Jogos que podem fazer Dome conquistar de vez a torcida, que ainda anda um pouco desconfiada do catalão.