É possível personificar a tragédia que é este Botafogo em diversos personagens. Os maiores responsáveis por esta situação são os dirigentes, que juntaram as peças deste elenco e, dentre os clubes da elite, demitiram o maior número de treinadores nesta campanha de futebol brasileiro. Mas em cada um dos jogadores também é possível ver um traço, uma mancha, desta que vai se tornando a pior temporada do clube em sua história.
Salomon Kalou possui algumas delas, como a expectativa fracassada. Se antes do início do Brasileirão esperava-se um Botafogo capaz de levar menos sustos na briga contra o rebaixamento, campeonato particular que há anos vem disputando, o histórico de Kalou e o de alguns astros do futebol internacional que chegavam ao Brasil levantava a expectativa de que algo no mínimo interessante pudesse acontecer. Não deixa de ser interessante ver um clube disposto a bater recordes, ainda que eles sejam negativos. No entanto, isso apenas reflete o quanto a expectativa foi fracassada.
Depois da derrota por 2 a 0 para o Athletico-PR, dentro do Estádio Nilton Santos, que deixa este Botafogo sem reação ainda afundado na zona de rebaixamento, o traço mais forte que uniu Kalou e Botafogo – Botafogo e Kalou – foi o desperdício de oportunidades. Contra o Furacão, o time alvinegro nunca chegou a dar a impressão de que venceria, mas, como que para se livrar da bola muitas vezes, arriscou 24 finalizações e acertou oito na direção do gol. Salomon foi o único dos titulares do ataque que não exigiu defesas do goleiro Santos.
December 9, 2020
Foram quatro tentativas do marfinense nesta partida que exacerbou o quão ruim é a sua finalização. As oportunidades mais incrivelmente desperdiçadas foram o chute no primeiro tempo por cima do gol, após cortar um defensor e se ver livre para bater na bola, e uma tentativa pra fora, na frente da meta, quando entrava em velocidade na pequena área após uma cobrança de falta. Esta última oportunidade veio depois da mais incrivelmente perdida: uma atabalhoada tentativa de finalização, também na pequena área, que terminou em um carrinho que apenas deixou Kalou sobre a linha do gol, entre as pernas do goleiro adversário que o olhava enquanto a bola saía quicando para fora.
Evidente que um jogador pode “não estar em seu dia”, mas no caso de Kalou as chances desperdiçadas são regra. Horas depois da derrota, o SofaScore, aplicativo especializado em estatísticas, informou que o marfinense é o botafoguense que mais desperdiçou o que considera ser “grandes chances de gol”: estufou as redes uma vez e jogou fora outras cinco. O número bate com as estatísticas da Opta Sports, que mostra ainda um agravo: dentre os atletas com o mínimo de porcentagem no aproveitamento destas grandes chances de gol, nenhum tem números piores aos de Kalou. Em todo o Campeonato Brasileiro.
Kalou aproveitou apenas 16.6% destas grandes chances de gol. Seu chute é ruim desde o momento em que bate seu pé na bola, a chuteira quase sempre indo de encontro com a parte inferior/mais extremada da esfera – lhe dando aquela propulsão necessária para voos tão altos a ponto de passar longe das dimensões das traves.
O Botafogo, que assim como Kalou está muito abaixo de suas competências, também teve muitas chances de não estar na penúltima colocação que se encontra hoje. Mesmo após estipular um novo recorde próprio de sequência de derrotas no Brasileirão, e de por duas vezes quase estipular um novo recorde de jejum de vitórias na Série A, as chances vão se apresentando ao Alvinegro. Se tivesse vencido Athletico-PR e Corinthians, dentro de sua casa, nestes seus últimos compromissos, estaria com 29 pontos e fora da zona de rebaixamento.
Quando, mesmo fazendo tudo para não dar certo, tantas chances são desperdiçadas, é lógico chegar à conclusão de que falta competência. Este grupo do Botafogo, incluindo aí todos os profissionais do futebol, parecem já ter aceitado o rebaixamento.
Além das expectativas fracassadas e da falta de competência para aproveitarem suas chances, Botafogo e Kalou – Kalou e Botafogo – também parecem duas almas sem fôlego em campo, apegados apenas às memórias de seu passado e sem apresentarem razões para que não se pense com pessimismo sobre o futuro.