Entre as três grandes "famílias" do futebol israelense, a do movimento sionista Beitar é sem dúvida a mais radical. São clubes com uma ideologia muito próxima do fundamentalismo religioso, e o Beitar de Jerusalém é o mais proeminente, em parte por causa das ações de seus ultras.
É 'vox populi' que em muitos clubes grandes decisões são tomadas com a aprovação do torcedor ultra, mas em Beitar isso foi além. 'La Familia' (em espanhol), como são chamados esses ultras, eram 'de fato' os donos do clube.
Nunca jogou um jogador de futebol árabe ou muçulmano no Beitar, e isso ocorreu porque 'La Familia' nunca teria permitido. O clube, a fim de evitar um conflito com seus seguidores, optou diretamente por nem tentar contratar jogadores árabes ou muçulmanos.
Os proprietários anteriores de Beitar praticamente fugiram do clube assim que tiveram uma chance. Os proprietários anteriores, de origem russa, toleraram 'A Família' e suas demandas, e acabaram se tornando pouco menos que prisioneiros de seus próprios ultras.
E eles tomaram a decisão de vender o clube assim que um potencial comprador apareceu. Esse era um jovem empresário de tecnologia chamado Moshe Hogeg. 'La Família' encontrou agora um rival à altura.
Hogeg chegou ao Beitar pronto para erradicar os comportamentos racistas e xenófobos que caracterizaram os torcedores do clube de Jerusalém durante esses anos. Para o novo jovem proprietário, esse tipo de atitude não deve ter lugar no futebol.
E o que ele fez para tentar conseguir esse bando de fundamentalistas sionistas irredutíveis? Optou por procedimentos judiciais. Assim, todo excesso de seus ultras começou a ser seguido por uma denúncia perante os tribunais.
Essa estratégia de assédio judicial a pessoas intolerantes foi apoiada por um forte escritório de advocacia. E 'La Família' começou a perder a guerra. Oprimidos ao ver como o processo foi levado a uma terra onde todos têm a perder, os episódios de racismo no campo de Beitar praticamente desapareceram.
E não há nada como a ameaça de uma denúncia que pode levar multas de até um milhão de euros para acalmar os ânimos dos mais exacerbados.
"Não tenho tolerância com o racismo. Absolutamente zero. E minha reação ao racismo não é proporcional. Você grita um comentário racista e vou processá-lo por um milhão de dólares", explicou Hogeg em entrevista à rede inglesa 'BBC'.
A prova da nova direção que Beitar está tentando tomar foi a incorporação de um jogador de futebol chamado Ali Mohammed. O jogador de futebol, de origem nigeriana e credo cristão, tocou todos os alarmes de 'La Familia' pelo nome, o do primeiro imã xiita, genro de Muhammad e o próprio profeta.
Era intolerável, e 'A Família' se enfureceu por isso. Eles até sugeriram ao jogador nigeriano que, se ele quisesse jogar no clube, o nome deveria ser mudado. E Hogeg começou sua travessia para erradicar 'La Família' ou, pelo menos, corrigir seus comportamentos indesejáveis.
"Meu trabalho não é educar os torcedores, não sou pai nem mãe deles. Mas não posso tolerar certos comportamentos", explicou o empresário. E hoje, como o jornal 'Marca' nos lembra, quando Ali Mohamed liga para o Beitar, todo o Estádio Teddy o celebra e canta seu nome.
O Beitar deu um passo importante em direção à erradicação do racismo e da xenofobia em seus seguidores conservadores, mas o verdadeiro teste decisivo virá quando Hogeg contratar um jogador de futebol árabe muçulmano. Só então podemos dizer que o Beitar de Jerusalém realmente mudou.